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quinta-feira, 12 de agosto de 2010

As raízes negras do judaísmo‏


Uma polêmica que envolve muitas vezes a palavra verdade, mas por pontos de
> vista que tornam a compreensão de onde ela realmente está um pouco confusa
>
> por ALEXANDRE DUARTE



O estudo dos livros sagrados feitos pelos judeus etíopes segue a tradição
> religiosa e é a base de sua cultura
>
> No dia 21 de novembro de 1984, o exército israelense deu início a uma das mais
> incríveis operações de resgate de que se tem notícia. Denominada de Operação
> Moisés, o plano envolvia a retirada de milhares de negros judeus da Etiópia,
> país em que eles viviam em condições miseráveis. Em um determinado momento, 28
> aviões israelenses estavam ao mesmo tempo no ar, carregados de afrodescendentes
> de origem judaica. Um desses jumbos chegou a entrar no livro dos recordes por
> carregar, de uma só vez, 1.087 passageiros, sendo que a lotação máxima era de
> 500. Essa comunidade, classificada de judeus etíopes, estava no país africano há
> mais de 2000 anos, preservando tradições daquela época e formando uma comunidade
> fechada, até que foram, aos poucos, oprimidos e perseguidos, obrigados a mudar
> suas tradições. Diziam-se descendentes da tribo da Dan, fundada por um filho do
> rei Salomão com a rainha de Sabá. Ao chegarem a Israel, muitos deles estavam
> longe das leis que regem o judaísmo, e tiveram que começar a se adaptar a uma
> nova vida. Apesar de terem encontrado uma estrutura política e econômica como
> nunca tinham recebido, esses novos habitantes do Estado israelense tiveram
> problemas para se acostumar às novidades. "Acho que eles se sentiram um pouco
> magoados, pois haviam sido perseguidos já na África e, em Israel, tiveram que
> passar por uma nova adaptação aos costumes judaicos" diz o rabino Reuven Segal,
> que serviu o exército com muitos judeus etíopes. "A nova geração já está mais
> adaptada, o problema maior foi com aqueles que chegaram nos anos 80. Os filhos
> deles já fizeram faculdade, servem exército, conhecem as leis", completa o
> rabino. Porém, toda essa história boa para um filme é só a ponta de uma polêmica
> maior, que envolve muitas vezes a palavra verdade, mas por pontos de vista que
> tornam a compreensão de onde ela realmente está um pouco confusa.por ALEXANDRE
> DUARTE
>
>
>
> De Chicago, nos EUA, para Dimona, em Israel, nos anos 70. A comunidade se
> desenvolveu nos últimos 40 anos e é referência para outros países africanos
>
> Essa confusão se dá desde a origem, já que alguns grupos se defi nem como
> hebreus israelitas, como explica a doutora em língua hebraica, literatura e
> cultura judaica, Jane Bichmacher de Glasman. "As palavras judeu, hebreu e
> israelita são empregadas indistintamente a um mesmo grupamento humano como
> sinônimos, embora cada uma traga em seu bojo ideias diferentes. Em síntese,
> pode-se dizer que hebreus refere-se primordialmente aos mais antigos ancestrais,
> Abraão, Isaac e Jacob". E é aí que entra a origem negra desses povos bíblicos. A
> doutora também lembra que o termo judeu se originou a partir de um dos nomes das
> doze tribos que correspondiam aos israelitas bíblicos e acabou virando o termo
> dominante nesse caso. "A palavra hebreu não aparece na Bíblia como gentílico,
> mas como adjetivo. Os livros bíblicos pré-babilônicos, isto é, anteriores ao
> exílio na Babilônia, não usam a palavra judeu, que só vai aparecer no período da
> Grande Sinagoga, em livros como Ester e Malaquias, e principalmente, na época
> dos domínios helênico e romano", completa Jane, afirmando que originalmente "os
> judeus têm sua origem na Mesopotâmia, e brancos eles não eram."
>
> Dessa forma, na África, existem diversas comunidades judaicas. Tudo começou a se
> estruturar com a saída do Egito, sob o comando de Moisés, quando judeus e
> egípcios se uniram numa única fuga. O próprio líder teria se casado com uma
> negra, Tsipora. Tudo isso originou dois povos muito antigos, os Lembas e os
> Falashas (termo pejorativo para estrangeiro) ou Beta- Israel. Os Lembas mantêm
> as tradições judaicas em vilas do continente africano. Os Falashas formavam uma
> comunidade fechada na Etiópia que só foi localizada no século 19 e reconhecida
> como judaica em 1947 pelos rabinos-chefes de Israel. Ainda existe, em Uganda, a
> comunidade Abayuadaya, fundada em 1919 e que sofreu uma conversão maciça, em
> 2002. Hoje em dia a comunidade conta com cerca de 1.100 pessoas, mas tinha 3.000
> quando o ditador Idi Amin Dada começou os persegui-los entre os anos de 1971 e
> 1979. Além dessa, na Nigéria existe a comunidade dos Ibos, que conta com cerca
> de 40000 pessoas. "Não existe razão alguma para que uma pessoa negra não possa
> ser judia e, de fato, existem milhares de judeus negros. Há pequenos grupos e
> congregações de autênticos judeus negros nos EUA, frequentemente descendentes de
> conversos, alguns descendentes de imigrantes das Índias Ocidentais", explica
> Jane.
>
> A imersão da hebreia israelita Miryham Ysrayl é,
> assim como está nas escrituras, uma espécie de
> batismo ancestral do povo hebreu A estrela de Davi (símbolo do judaísmo) e uma
> mensagem em hebraíco na porta de uma casa na comunidade de Abayudaya, em Uganda
>
> "EXISTE UMA DIFERENÇA ENTRE JUDEUS NEGROS E NEGROS PSEUDOJUDEUS. ESTES ÚLTIMOS
> SÃO NÃOJUDEUS QUE PRETENDEM PASSAR POR JUDEUS"
>
> O teólogo e historiador Walter Passos defende que o povo negro deve se
> reencontrar com sua raíz hebreia e seguir, entre outras coisas, a alimentação
> vegetariana



HEBREU VERSUS JUDEU



A polêmica se estabelece quando surge o termo hebreu confrontado com o judeu.
> Para o rabino Reuben não há diferença entre uma coisa e outra. Já para quem se
> defi ne como hebreu sem seguir o judaísmo a coisa é um pouco diferente, como
> explica o teólogo e historiador Walter Passos. "Os hebreus originais foram
> negros e os seus descendentes também o são. Não há um momento da história de
> Israel que date a formação dos hebreus. O judaísmo não está escrito em nenhum
> livro da Bíblia e há negros que seguem essa religião, mas a maioria dos hebreus
> israelitas não a segue. A mídia, os livros de história, o cristianismo e o
> judaísmo ignoram o termo hebreu". Essa espécie de divisão é um dos pontos
> perigosos ao se tratar do tema. Explicando, por exemplo, a comunidade negra dos
> hebreus israelitas que saíram dos EUA em 1969, a fim de migrar para Israel e se
> estabelecer em Dimona, a doutora Jane diz que "existe uma diferença entre judeus
> negros e negros pseudojudeus. Estes últimos são não-judeus que pretendem passar
> por judeus. Em particular, há um grupo que se autodenomina 'israelitas negros'
> ou 'hebreus etíopes' e outras denominações semelhantes, que são negros
> não-judeus que têm inventado uma história na qual afirmam ter velhas raízes".
> Confi rmando isso, mas do lado oposto, Miryahm Ysrayl, que se denomina 'hebreia
> israelita' e vive hoje na Europa, conta que a relação com os judeus não é fácil
> para quem não segue o judaísmo. "Os judeus alegam que somos impostores, que
> precisamos passar por uma conversão para o judaísmo, apesar de eles não terem
> nem sequer um verso das escrituras que comprove que eles são os verdadeiros
> filhos de Israel". Mas, para Miryahm, esse tipo de situação pode provocar
> desentendimentos, os quais ela e a maioria dos hebreus israelitas desaprovam. "O
> movimento não segue um pensamento homogêneo, há diversidades em nosso meio com
> alguns, que após tomarem conhecimento de sua identidade, agem de forma que não
> aprovamos, agredindo verbalmente pessoas de pele branca pela rua", conta ela. E
> isso teria piorado com a publicação do livro e Secret Relationship Between
> Blacks and Jews em que, segundo Miryahm, "o autor revela que os navios negreiros
> eram quase 100% de propriedade de judeus".


A CONSCIÊNCIA DO PASSADO

Essa relação é tão complexa que se liga, com um intervalo de séculos, com o
> movimento de migração para Dimona, idealizado por Ben Ami Ben-Israel, nascido
> Ben Carter, em Chicago. Foi em sua cidade natal que ele começou a reunir membros
> que acreditavam, como ele, serem os descendentes legítimos da tribo israelita
> perdida de Judá que, após a destruição do templo judaico em Jerusalém, migraram
> para a África, e depois foram escravizados e trazidos para a América. No final
> dos anos 60, esse grupo migrou para a Libéria e mais tarde se estabeleceu na
> cidade israelense de Dimona, que hoje conta com cerca de 3.000 hebreus negros.
> "O governo não sabia o que fazer com os recém-chegados que adotaram nomes
> hebraicos, um estilo de vestir do oeste da África e não eram nem judeus nem
> cristãos", conta Jane. Já para Walter, o que os moveu foi a consciência de seu
> passado. "Os hebreus de Dimona sabem que os verdadeiros hebreus - após a
> destruição dos reinos de Israel e de Judá e após a dominação romana - voltaram
> para o continente africano, fato relatado por diversos historiadores, como
> Flavio Josefo. Nesta caminhada, muitos se instalaram na África Ocidental, onde
> fundaram reinos importantes e mantiveram tradições hebraicas. Posteriormente,
> foram escravizados e sequestrados para as Américas." Essa comunidade, em
> especial, apesar das adversidades, conseguiu se desenvolver e hoje é
> internacionalmente reconhecida e desenvolvida em alguns aspectos como no cultivo
> de uma agricultura orgânica, que impulsionou a volta a uma alimentação
> vegetariana, fortemente defendida por Walter, inclusive para a população negra
> em geral. Apesar de todas as diferentes visões envolvendo a questão, a mensagem
> que prevalece é a de um convívio pacífico entre as diferentes crenças e raças.
> Quando se trata de Brasil, Jane logo afirma que o país é privilegiado,
> principalmente, quando se trata de algum traço racista nesse assunto, por nunca
> ter presenciado uma política abertamente segregacionista como nos EUA, por
> exemplo, sem deixar de afirmar que existe o preconceito. Para ela, um modelo
> desse convívio a ser seguido são o dos quilombos. "É muito importante lembrar
> que no Brasil, além de negros, os quilombos reuniam 'bruxas', hereges, ciganos e
> judeus. Há registros da presença permanente nas aldeias de mulatos, índios e
> brancos. A perseguição da época às minorias étnicas, explica brancos terem ido
> viver no quilombo de Palmares", encerra a doutora.
>
> Fonte: http://racabrasil. uol.com.br/ /cultura- gente/144/ artigo175954- 1.asp

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